Como o preço do petróleo em queda deve afetar o plano de investimentos da Petrobras
A estabilização do preço do petróleo na casa dos US$ 60 o barril do tipo Brent, com possibilidade de uma queda maior, trouxe um dilema para a Petrobras na elaboração do seu Plano de Negócios 2026-2030. O mais recente orçamento foi formulado para os próximos anos tomando como base um petróleo bem mais elevado, em torno de US$ 80 o barril. Diante desse cenário, especialistas acreditam que a estatal terá de optar entre se endividar ou reduzir investimentos em pleno ano eleitoral.
Se não quiser se endividar ou cortar projetos, a companhia teria de, no mínimo, adiar alguns investimentos diante de uma drástica queda de receita. Na cúpula da empresa, apurou o Estadão/Broadcast, a disposição é manter o portfólio, mas, ao mesmo tempo, reduzir um pouco o valor de US$ 111 bilhões previstos no plano anterior, para um nível mais próximo dos US$ 100 bilhões. O martelo, porém, ainda não foi batido pela petroleira.
Em ano eleitoral, a percepção do mercado é de que dificilmente projetos sejam totalmente abandonados, mas sim adiados, com aumento de projetos em avaliação emdash; hoje da ordem de US$ 16 bilhões emdash;, assim como é esperada a otimização de custos, como tem propagado a própria presidente da companhia, Magda Chambriard. Aumentar o endividamento, o que poderia reduzir dividendos, não é uma opção, na avaliação de alguns analistas, já que o patamar da dívida é um dos pilares do Plano da estatal.
Um analista, pedindo anonimato, observa que o plano é autofinanciado, ou seja, não requer tomar dívida, e um pilar importante é não mexer na política de dividendos. Com isso, a geração de caixa menor por conta de um preço de petróleo mais baixo precisa ser compensada de outra forma. Ele ressalta que um fator positivo, que compensa parcialmente o preço em baixa, é a produção, que está crescendo.
E se o petróleo cair para US$ 50?
De alguma maneira, será necessário ajustar o novo plano, de acordo com Adriano Pires, o diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (Cbie) e colunista do Estadão. Conforme Pires, que por pouco não foi presidente da estatal, os mais otimistas preveem a commodity (matéria-prima cotada em dólar) operando no ano que vem abaixo dos US$ 60 o barril emdash; entre US$ 55 e US$ 58 emdash;, enquanto os mais pessimistas já projetam barril de US$ 50. Apesar de o plano da estatal ser quinquenal, por conta das eleições os olhos do mercado estarão voltados mais para 2026 do que para o fim da década.
eldquo;Está tendo uma oferta de petróleo maior do que a demanda. A Rússia continua vendendo petróleo por causa da guerra, o Brasil está com a produção crescente, a Guiana está produzindo, o shale americano (petróleo não convencional) está produzindo, e o mundo não está crescendoerdquo;, avalia Pires. eldquo;É preciso reduzir o preço (do petróleo) para voltar a ter o equilíbrio entre a oferta e a demandaerdquo;, explica.
Ele prevê que no próximo ano, as petroleiras, de maneira geral, terão de ter muita disciplina de capital, e é possível ver novamente um movimento de fusões e aquisições, onde as empresas mais endividadas serão compradas. No caso da Petrobras, os acionistas podem ser prejudicados pela queda de receita, que pode reduzir dividendos, e devem ficar atentos por se tratar de um ano eleitoral.
eldquo;Não interessa quem está sentado na cadeira, mas a Petrobras é um instrumento importante para ajudar a ganhar a eleição. Mas usar a empresa em um momento de petróleo baixo pode prejudicar os resultadoserdquo;, alerta. Por outro lado, destaca Pires, o preço baixo do petróleo pode ajudar o governo, à medida que será possível reduzir o preço dos combustíveis em um ano eleitoral.
Nas contas do analista de energia da Ativa Investimentos, Ilan Arbetman, a diferença de US$ 15 do barril do Brent de um plano para outro pesa na receita da companhia, e as perdas podem chegar à casa dos bilhões de reais. Ele espera que a empresa combine no próximo plano o crescimento da produção, gestão de custos e disciplina na aprovação de projetos.
eldquo;Um ponto crítico sempre é a sensibilidade da receita ao preço do petróleo: uma redução de US$ 15 por barril ao longo de 2025-2029 (US$ 80 para US$ 65 barril ) poderia gerar uma diferença de aproximadamente R$ 362 bilhões em receitas em cinco anos, considerando produção diária crescente de 2,3 a 2,5 milhões de barris e câmbio médio de R$/US$ 5,5erdquo;, calcula.
elsquo;O céu está bem nubladoersquo;
Outro ponto relevante, destaca Arbetman, poderá ser a revisão do teto de endividamento bruto, atualmente em R$ 75 bilhões, com dívida líquida de cerca de R$ 68 bilhões. eldquo;É possível que esse limite seja estendido, aumentando a flexibilidade financeira para investimentos estratégicos sem comprometer a solidez da companhia. Com essas medidas, o Plano Estratégico da Petrobras deve reforçar sua resiliência operacional e financeira, permitindo enfrentar volatilidade no preço do petróleo e mantendo geração de valor para acionistaserdquo;, diz.
Já para o professor e pesquisador no Instituto de Energia da PUC-RJ Edmar Almeida, desde o início do governo Trump foi dado o sinal para preços menores do petróleo, com um certo alinhamento entre a Casa Branca e a Organização dos Países Exportadores de Petróleo e aliados (Opep +).
Do lado do governo norte-americano, a preocupação é com a inflação. Da parte da Opep, um preço menor da commodity dá um freio na produção de petróleo não convencional (shale) nos Estados Unidos.
Almeida destaca que a retração da economia global tem ajudado a manter a demanda por petróleo em baixa, ao mesmo tempo que conflitos geopolíticos não deixam o preço ceder demais. No caso do fim dos conflitos, como da guerra entre Israel e o Hamas, que vem sendo costurado, a tendência é de que o preço caia ainda mais. eldquo;Você mira US$ 60, US$ 70, e isso escorrega para US$ 40, US$ 50erdquo;, explica, lembrando que no choque do petróleo em 2014, os preços saíram de US$ 100 para US$ 30 o barril.
eldquo;A Petrobras dispõe de caminhos diversos para se ajustar. A escolha dependerá das prioridades da companhia em meio a um 2026 eleitoral e de elevada incerteza econômica. Nós estamos num momento de mudança do cenário macroeconômico, não é um bom momento para o setor de petróleo, o céu está bem nubladoerdquo;, diz Almeida.