Trump mira etanol e culpa tarifas de importação, mas parte do problema foi criado pelos EUA
O governo Trump culpou as tarifas de importação do Brasil pela queda no comércio de etanol entre os países. Mas a perda do que antes era o maior mercado de exportação para o biocombustível americano é, em parte, um problema criado pelos próprios Estados Unidos.
O Brasil reduziu drasticamente sua dependência das importações de biocombustíveis dos EUA ao investir bilhões de dólares em etanol de milho, criando uma indústria nacional que posteriormente o Brasil passou a proteger por meio de tarifas. A iniciativa começou em 2017, liderada pelo Summit Agricultural Group, com sede em Iowa, cuja unidade chamada FS instalou a primeira usina de etanol de milho do Brasil.
As barreiras ao etanol americano estão no centro da investigação que o governo Trump implementou sobre as práticas comerciais do Brasil, tornada pública na terça-feira. Na semana passada, o presidente prometeu impor tarifas de 50% em remessas do país sul-americano a partir de 1º de agosto, ameaçando os consumidores dos EUA com preços potencialmente mais altos para tudo, de café a carne bovina e papel higiênico.
O Brasil deve produzir 10 bilhões de litros de etanol de milho este ano, segundo a consultoria Datagro, com a unidade FS da Summit entre os principais fornecedores. A FS, que agora opera três unidades de moagem de milho, produz 2,3 bilhões de litros do biocombustível anualmente, segundo dados da empresa.
emdash; O etanol de milho trouxe uma oferta adicional suficiente para cobrir a demanda emdash; diz Ana Zancaner, analista da Czapp, empresa de propriedade da trader de commodities Czarnikow Group Ltd.
A crescente produção de etanol de milho no Brasil significa que as importações não são atrativas na maior parte do tempo.
emdash; Mesmo que as tarifas fossem zero, seria difícil viabilizar a importação de etanol americano emdash; disse Plínio Nastari, presidente da Datagro.
É um debate crucial para a relação comercial do Brasil com seu segundo maior parceiro comercial. O país sul-americano implementou tarifas em 2017, após os EUA terem inundado o mercado com etanol, pressionando os preços.
Ao anunciar sua investigação na terça-feira, o escritório da Representação Comercial dos EUA acusou o Brasil de reverter sua posição anterior sobre a isenção de impostos, impondo taxas significativamente mais altas ao combustível americano.
emdash; Há quase uma década que dedicamos tempo e recursos preciosos para lutar contra um regime tarifário injusto e injustificado emdash; afirmou Geoff Cooper, presidente-executivo da Associação de Combustíveis Renováveis, grupo comercial de etanol. emdash; Essas barreiras tarifárias foram erguidas contra as importações de etanol dos EUA, enquanto nosso país aceitou abertamente emdash; e até mesmo encorajou e incentivou emdash; as importações de etanol do Brasil.
Ainda assim, embora o Brasil imponha tarifas de 18% sobre o biocombustível importado, a medida veio acompanhada de uma crescente produção doméstica que teve os investidores americanos como principais protagonistas. Cargill, a maior empresa privada dos EUA, também é produtora de etanol de milho no Brasil.
elsquo;Praticamente inexistenteersquo;
emdash; O etanol de milho era praticamente inexistente, e agora essa é uma produção que é feita até com a participação de empresas americanas emdash; disse Nastari.
A Summit não quis comentar. A Cargill não respondeu imediatamente a um pedido de comentário.
O Brasil é o segundo maior produtor mundial de etanol e um grande consumidor de biocombustíveis. Embora a maior parte da produção do país venha da cana-de-açúcar, o combustível do milho está rapidamente ganhando participação.
Tudo começou com a FS, que inaugurou a primeira usina de etanol de milho do Brasil, no estado do Mato Grosso, há oito anos. Muitas outras se seguiram. A Unem, associação industrial que inclui a Cargill e a FS, contabiliza um total de 24 usinas em operação e outras 16 a serem construídas.
O Brasil exporta algum etanol para os EUA, com incentivos na Califórnia para combustíveis de baixo carbono ajudando a impulsionar as remessas de etanol para cerca de 300 milhões de litros no ano passado.
Ainda assim, a ameaça de Trump de uma tarifa de 50% sobre o Brasil tem pouco impacto sobre os produtores brasileiros de biocombustíveis, disse Willian Hernandes, sócio executivo da consultoria FG/A. Com apenas 5% do etanol brasileiro sendo exportado, o mercado interno é visto como muito mais relevante para os produtores brasileiros, acrescentou.
(Bloomberg)