Acelen e Mubadala apostam na macaúba para desenvolver até 5 polos de combustíveis renováveis
A busca por alternativas aos combustíveis fósseis para reduzir as emissões de gases poluentes é uma obsessão global. E o agronegócio brasileiro, em sinergia com a indústria de biorrefino, parece ter encontrado uma solução viável para a produção de óleos vegetais que serão a matéria prima para fabricação de diesel renovável e de combustível sustentável de aviação. Se engana quem acha que essa solução passa pela cultura da soja. É na macaúba, uma planta nativa do cerrado, que a Acelen aposta as fichas, investirá US$ 3 bilhões em uma bioferrinaria na Bahia para produzir 1 bilhão de litros e avalia investir em até cinco polos para o desenvolvimento da cultura em todo o Brasil, com a construção de outras biorrefinarias.
Em entrevista exclusiva à EXAME, o CEO da Acelen, Luiz Mendonça, afirmou que o projeto de biorrefino é a prioridade da empresa, que foi criada em 2021 quando o Mubadala - o fundo soberano dos Emirados Árabes Unidos endash; comprou a refinaria de Mataripe da Petrobras. Agora, a estatal negocia a recompra do ativo. A planta industrial que completou 74 anos em 17 de setembro recebeu $ 600 milhões de investimentos.
Mendonça não fez comentários sobre a negociação em curso entre as duas partes. Entretanto, avalia que o Brasil é o país com mais oportunidades para a produção de energia.
eldquo;Tenho 30 e poucos anos nas indústrias química, petroquímica, de energia, de óleo e gás. Esse dinamismo brasileiro sempre foi presente, faz parte. Esse dinamismo, por vezes, é ruim porque reduz a capacidade de previsão de um investidor, mas traz oportunidades. O Mubadala não enxergou apenas a refinaria de Mataripe, mas viu no Brasil um país com enorme potencial no setor de energiaerdquo;, disse.
Mataripe completa 74 anos renovada
Com os investimentos da Acelen, a refinaria de Mataripe aumentou a capacidade diária de produção, que passou de 207 mil barris em 2021 para 250 mil barris, atualmente. Com isso, a produção de diesel aumentou 33% e a de querosene de aviação outros 181%.
Além disso, de dezembro de 2021 a agosto de 2024, a empresa reduziu em 26% o consumo total de água da refinaria, uma economia de 4,7 bilhões de litros, equivalente ao volume usado em uma cidade de 109 mil habitantes. eldquo;Se todas as refinarias do Brasil fizessem isso, nós não precisaríamos importar dieselerdquo;, disse.
No mesmo período, houve economia de 9% no consumo de energia, o equivalente ao consumo residencial de eletricidade de todo o estado de Roraima. Também foram reduzidas as emissões de gases poluentes em 46% e, de enxofre, em 87%, além de ter gerado menos 30% de resíduos em 2023, uma redução de mais de 7 mil toneladas.
eldquo;Eu te diria que fizemos a nossa parte, honramos todos os compromissos e ultrapassamos nossos objetivos em termos operacionais. É uma refinaria diferente da que a gente comprou. Também criamos empregos. Quando compramos a refinaria, tinha 800 pessoas e hoje temos mais de 1.100erdquo;, afirmou Mendonca.
Além disso, a companhia investirá outros R$ 530 milhões em Irecê (BA) para construir uma usina de energia solar que terá capacidade instalada de 161MW. A geração de energia renovável e limpa levará a empresa a abater 128 mil toneladas de CO2 por ano.
Biorrefino já é realidade
Em paralelo ao trabalho na refinaria de Mataripe, Mendonça afirmou que sempre foi provocado pelo Mubadala sobre como diversificar a produção de combustíveis no país. eldquo;O refino de combustíveis fósseis ainda será importante por décadas. Garante segurança energética. Por outro lado, vislumbramos a possiblidade de construir uma unidade adicional de biorrefinoerdquo;, disse.
Os planos da companhia preveem o aporte de US$ 3 bilhões, dos quais US$ 1 bilhão na construção da fábrica de combustíveis e outros US$ 2 bilhões no desenvolvimento da cultura da macaúba em 180 mil hectares de pastagens degradadas em Minas Gerais e na Bahia. A empresa deve concluir o projeto de engenharia da biorrefinaria até o fim deste ano, começar a obra no início de 2025 e terminar o empreendimento em 2027.
Para desenvolver o cultivo da planta nativa brasileira de alto valor energético a empresa iniciou um investimento de R$ 250 milhões em pesquisa e inovação, que prevê a construção do Acelen Agripark, um centro tecnológico, em Montes Claros, em Minas Gerais.
No local serão desenvolvidos projetos pilotos de plantio, manejo, pesquisa genética, além do aprimoramento industrial para o esmagamento da macaúba para transformação em óleo vegetal.
Para 2025, o planejamento prevê a criação de uma fazenda piloto, com 5 mil hectares de macaúba. A planta é de sete a dez vezes mais produtiva por hectare plantado em comparação à soja. A meta é chegar em 2031 ou em 2032 com 180 mil hectares em áreas de pastagem degradadas.
Brasil contribui para segurança energética do mundo
Segundo o executivo, o Brasil é o único país do mundo em que há integração entre o agronegócio e a indústria para a produção de óleos vegetais. A soja seria uma escolha natural diante da abundância de lavouras, mas a Acelen preferiu apostar na macaúba como material primária.
Mendonça afirmou que existem pesquisas há 40 anos sobre a planta do cerrado. No setor das energias e combustíveis renováveis, disse o executivo, não há problema para construir uma biorrefinaria. Entretanto há dúvidas sobre qual a matéria prima que abastecerá a produção global de combustíveis renováveis.
eldquo;Não há matéria prima disponível para isso. A tecnologia para transformar a matéria prima em óleo existe. O desafio é encontrar a matéria prima competitiva. Foi no agronegócio brasileiro que encontramos esse espaço para inovação abertaerdquo;, disse.
Para Mendonça, as oportunidades são inúmeras no biorrefino e o projeto é ambicioso ao ponto de ser possível criar, a partir de uma planta brasileira, matéria prima para a indústria mundial de combustíveis renováveis. Segundo ele, só os mandatos assinados para uso de combustível sustentável de aviação na Europa preveem uma demanda de 17 bilhões de litros até 2030.
E as expectativas com o sucesso do projeto são altas. Nas conversas internas com o Mubadala já há expectativa de que outros quatro ou cinco polos de produção de macaúba sejam desenvolvidas em outras regiões do Brasil, com a construção de novas biorrefinarias.
eldquo;Podemos ter mais quatro ou cinco hubs [de plantação de macaúba com novas biorrefinarias]. Na medida que melhorar a produtividade, nós vamos produzir mais macaúba com menos área. A vantagem é que a macaúba não compete com outra cultura. É uma planta resiliente que demanda menos água. É uma floresta permanente. Não corto e replantoerdquo;, disse.