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Desde que foi promulgada a Emenda Constitucional nº 31/2000, os estados e o Distrito Federal foram autorizados a instituir Fundos Estaduais de Combate à Pobreza (Fecp) financiados por cobrança adicional de ICMS sobre produtos e serviços supérfluos.

Inicialmente, o estado do Rio de Janeiro instituiu o Fecp em 2002 e o assunto foi motivo de embate. Os contribuintes levaram o tema ao STF (Supremo Tribunal Federal) em inúmeras oportunidades por alegações de inconstitucionalidades, dentre elas, a cobrança sobre produtos e serviços que evidentemente não são supérfluos.

Recentemente, todavia, o estado do Rio publicou a Lei Complementar (LC) 210/23, revogando a lei anterior com objetivo de "reestruturar" o Fecp, prevendo a obrigatoriedade de recolhimento ao fundo de 2% ou 4% de ICMS adicional sobre inúmeras operações, dentre elas, com combustíveis, comunicação e energia elétrica. Essa tentativa de aumentar a arrecadação tributária acarreta, contudo, na violação da Constituição Federal e do posicionamento do STF, o que certamente levará à judicialização do tema e o efeito será justamente o contrário do pretendido, criando um rombo nas contas públicas.

A leitura do que deve ser entendido como "supérfluo" passa pela análise do que seria, em contraponto, "essencial". E o STF, ao analisar o tema, decidiu que os serviços de comunicação e o fornecimento de energia elétrica são essenciais, o que impossibilitaria os estados de instituírem uma cobrança de ICMS maior do que a aplicável para operações regulares, conforme decidido no Recurso Extraordinário 714.139, julgado em 18 de dezembro de 2021.

E seguindo esse entendimento, o Congresso Nacional editou a LC 194/22, para deixar claro que "os combustíveis, o gás natural, a energia elétrica, as comunicações e o transporte coletivo são considerados bens e serviços essenciais e indispensáveis, que não podem ser tratados como supérfluos".

Mesmo diante da oportunidade de editar nova legislação que refletisse este contexto, o Rio de Janeiro optou por ignorar todo o entendimento sobre a matéria ao instituir cobrança evidentemente inconstitucional.

A inconstitucionalidade dessa cobrança é evidenciada por dois motivos: primeiro, por ir no sentido contrário do que dispõe lei federal sobre o tema, competência esta atribuída pela Constituição Federal; e segundo, pois institui cobrança em patamares superiores às operações regulares.

Como resultado, a cobrança adicional de ICMS acarretará prejuízos à população fluminense, visto que o ônus financeiro deste aumento inconstitucional será repassado para o consumidor final no preço dos produtos e serviços.

Mais ainda, essas cobranças indevidas certamente serão judicializadas, o que poderá levar ao efeito reverso pretendido pelo estado: em vez de aumentar a arrecadação com o tributo adicional, o estado deverá restituir aos contribuintes os recolhimentos feitos indevidamente, levando a incontáveis prejuízos ao cofre público estadual.

Neste contexto, ao instituir o "novo" Fecp, o Rio de Janeiro incorre em violação à Constituição Federal e ao posicionamento do STF, o que deverá ser reconhecido pelo Poder Judiciário.

Com isso, o Rio de Janeiro perde a oportunidade de criar um ambiente de negócios atrativo para os investidores ao gerar um cenário de evidente insegurança jurídica, o que poderá afastar os investimentos no estado.

Ricardo Cosentino
sócio do escritório Mattos Filho

Marcus Vinícius Araújo
advogado do Mattos Filho

Fonte/Veículo: Folha de S.Paulo

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