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Ao prorrogar a desoneração de tributos incidentes sobre combustíveis, medida adotada pelo governo Jair Bolsonaro (PL) em meados do ano passado, o recém-empossado governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) terá que lidar com a reação do setor sucroenergético, por causa dos efeitos da medida sobre a produção de etanol. Como atinge a gasolina e o etanol ao mesmo tempo, a medida adotada por Bolsonaro torna o biocombustível nacional menos vantajoso, para os consumidores, do que o derivado do petróleo.

Quando os tributos foram reduzidos ano passado, uma emenda constitucional foi aprovada, em julho, para garantir o eldquo;diferencial de competitividadeerdquo; dos biocombustíveis endash; uma nota técnica da equipe de transição de governo alertou que a prorrogação das desonerações poderia ser inconstitucional por isso. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, foi contra a manutenção da desoneração, mas venceu a posição da ala política do novo governo, preocupada com os efeitos, sobre a popularidade, de um reajuste de preços nas bombas de postos País afora.

De acordo com uma fonte da cúpula petista, a resistência de Haddad e de seus auxiliares a prorrogar a desoneração foi responsável pelo eldquo;atrasoerdquo; na publicação da Medida Provisória (MP) que prorrogou as desonerações de tributos. O texto estava prometido logo para o dia da posse, domingo, 1º, mas só saiu nesta segunda-feira, 2. Por causa disso, a MP veio numa edição extraordinária do Diário Oficial da União (DOU), não na edição regular.

Com a confirmação da prorrogação das desonerações, os telefones de figuras-chave do governo e da equipe econômica tocaram dezenas de vezes ao longo do primeiro dia útil da nova gestão, com líderes do setor de etanol enfurecidos com a medida. Antes de a MP ser publicada, a Unica, entidade que representa o setor de açúcar e etanol, divulgou nota afirmando que o novo governo atuou como eldquo;cúmplice de um atentadoerdquo; com a decisão.

eldquo;O governo Lula se torna cúmplice de um atentado econômico, ambiental, social e jurídico, especialmente depois de ter se comprometido com um novo padrão de combate às mudanças climáticas há poucas semanas na COP-27 (Cúpula do Clima das Nações Unidas)erdquo;, diz a nota, assinada em conjunto com o Fórum Nacional Sucroenergético (FNS).

A União Nacional do Etanol de Milho (Unem) disse, também em nota, que a prorrogação das desonerações é eldquo;inconstitucionalerdquo;. Segundo a entidade, ao prorrogar a isenção de tributos sobre combustíveis fósseis, o governo federal eldquo;enfraquece a política nacional de incentivo aos biocombustíveis, a transição energética e a descarbonizaçãoerdquo;. eldquo;O governo federal traz enorme prejuízo para a cadeia produtiva do etanol de milho, desde a produção primária no campo até os empregos nas indústrias e postos de revendaerdquo;, diz a Unem.

Para cumprir a emenda constitucional do ano passado, a gasolina teria que ser reajustada em, no mínimo, R$ 0,45 por litro a partir de 1º de janeiro, estima a nota técnica da equipe de transição que alertou para o problema. O documento, obtido pelo Estadão/Broadcast, descreve um cenário de crise nos preços de combustíveis, deixada pelo governo Bolsonaro. Uma das críticas é o fato de que a redução das alíquotas dos tributos foi feita de forma temporária, em ano eleitoral, e com elevado custo fiscal. A nota técnica da equipe de transição calcula a perda de arrecadação, caso a desoneração a zero dos tributos federais sobre gasolina, diesel, etanol hidratado e querosene de aviação (QAV) seja mantida por todo 2023, em R$ 53,3 bilhões.

Caso as alíquotas de tributos federais sobre os combustíveis fossem restabelecidas logo em 1º de janeiro, eldquo;os acréscimos previstos serão de cerca de R$0,69 por litro de gasolina e R$0,33 por litro de dieselerdquo;, diz a nota técnica. eldquo;Desta forma, o governo precisa ponderar as ações para conter os efeitos deixados pelas ações da gestão anterior e adotar medidas assertivas no curto, médio e longo prazoerdquo;, continua o documento.

Segundo a nota técnica, a Emenda à Constituição 123, do ano passado, impediria a prorrogação da desoneração fiscal sobre a gasolina. O texto constitucional, aprovado no contexto das medidas visando reduzir os preços dos combustíveis, garante o eldquo;diferencial de competitividadeerdquo; para os biocombustíveis, no mesmo nível de 15 de maio de 2022, mas abre a exceção para a desoneração fiscal temporária até o fim do ano passado. Terminado o prazo, gasolina e etanol não podem ficar, os dois, com alíquota zero, porque isso impossibilitaria manter o eldquo;diferencialerdquo;.

Tarcilo Rodrigues, diretor da Bioagência, comercializadora independente de açúcar e etanol, acredita que em dois meses a tributação será retomada sobre os combustíveis, favorecendo os biocombustíveis. Para o especialista, o governo federal possui um eldquo;rombo fiscal gigantescoerdquo; e não poderá abrir mão dessa arrecadação. eldquo;Foi uma decisão política, para não trazer uma notícia de impacto desagradável para o consumidor na entrada do mandato, que traz um ônus bastante significativo (ao etanol) com a perda de competitividadeerdquo;, disse Rodrigues.

Fonte/Veículo: O Estado de São Paulo

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