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A redução de dois para um ano e outras alterações realizadas pela Câmara no texto da eldquo;PEC de Transiçãoerdquo; não diminuem o risco fiscal do país, tendo mais impactos políticos do que econômicos. Essa é avaliação do economista e pesquisador associado do Insper, Marcos Mendes.

O economista destaca que, quando há um ambiente favorável ao aumento de gastos, como o atual, não há regra fiscal que evite o avanço das despesas. Para Mendes, a discussão de uma nova âncora fiscal deve passar pelo controle das despesas e não pela trajetória da dívida.

Como avalia as alterações feitas no texto apresentado?

Foram cortados alguns excessos, como permitir gasto fora de teto com dinheiro emprestado do Banco Mundial e de agências internacionais, mas o que ficou ainda é muito problemático.

A redução de dois para um ano tem pouca relevância em termos fiscais. A maior parte da despesa que vai ser aumentada agora é obrigatória e rígida. Daqui a um ano, você não vai reduzir essa despesa.

Continuamos com valores muito altos. Temos R$ 168 bilhões mais algumas despesas com universidades e institutos de pesquisa, você chega a R$ 170 bilhões. Mas, além da PEC, estão acontecendo outras coisas, como a PEC que prevê que a União pague o custo do piso salarial dos enfermeiros. Nas contas do mercado, isso dá R$ 18 bilhões.

Qualquer coisa acima de R$ 190 bilhões, vai ser muito difícil você controlar a trajetória da dívida no ano que vem.

E o relator do Orçamento já avisou que vai corrigir o teto acima da inflação, porque ele vai usar a taxa de inflação esperada quando o governo mandou o projeto de Orçamento. E de lá para cá, essa taxa caiu. Só essa diferença dá mais de R$ 24 bilhões de despesas.

Você ainda tem a liminar do ministro Gilmar Mendes para o Bolsa Família ser pago fora do teto. E não tem nada na liminar que diga que, caso seja aprovada uma PEC, ela não possa ser usada. Há uma série de medidas paralelas à PEC, que aumentam a despesa e a incerteza mais à frente.

Um dos argumentos do governo eleito para a aprovação da PEC eram as falhas do Orçamento para 2023 enviado pelo governo Bolsonaro. Com o texto aprovado, ainda restam incertezas sobre o Orçamento?

Não era necessário esse valor de R$ 145 bilhões se você estava preocupado com o aumento do Bolsa Família e algumas despesas como Farmácia Popular e fazer complementação do Orçamento.

Você poderia conseguir R$ 20 bilhões reformulando o Auxílio Brasil, que está muito mal desenhado. E ocorreu um processo de avanço sobre o Orçamento, com o aumento de outras despesas, como emendas parlamentares, que comprimiram o Orçamento.

A sociedade brasileira está evitando fazer escolhas de onde evitar despesas. Quando não fazemos essa escolha, acabamos escolhendo inflação, juro alto, baixo crescimento e incapacidade de atender os mais pobres.

Mesmo com a PEC desidratada, o debate sobre cortes de juros deve ser postergado?

Acredito que sim. O mercado, tanto os investidores nacionais quanto principalmente os estrangeiros, não acordaram para o entalo fiscal que estamos criando.

Quando você olha a PEC e outras coisas que estão em volta, você vê que tem um ambiente político muito negativo do lado fiscal e com um Poder Executivo concordando com tudo isso. Estamos criando um ambiente de incerteza muito grande.

O futuro ministro da Fazenda defende que as receitas estão subestimadas no Projeto de Lei Orçamentária (PLOA) para 2023. Mesmo que elas estejam, será suficiente para a alocação de todo o gasto contido na PEC?

A receita cresceu muito principalmente pelo aumento de preços de commodities. O problema é que a gente não controla essa variável. Se ano que vem, dermos a sorte de esses preços continuarem altos, vamos arrecadar, mas e se eles tombarem?

Não é porque a receita está bombando que eu vou poder aumentar a despesa à vontade. E, no Brasil, a maior parte da despesa é obrigatória. Na hora que a receita cair, a despesa não vai cair, porque ela é rígida. E aí você entra em uma crise fiscal.

Boa parte da receita do governo é vinculada a algum tipo de despesa. Não é trivial fazer ajuste fiscal pelo lado da receita, porque boa parte dele já é comido com despesa obrigatória vinculada.

O nosso sistema tributário é muito ineficiente e qualquer ponto percentual que você aumenta de carga tributária, você inviabiliza uma série de negócios. E a nossa carga tributária já é muito alta.

Como avalia a divisão dos R$ 19,4 bilhões que eram destinados ao orçamento secreto na proposta da PEC?

Não reproduz o modelo do orçamento secreto, porque tem um pouco mais de transparência, mas ainda tem um efeito ruim das emendas sobre o Orçamento. Com relação à metade que vai ser liberada ao governo só em 2024, isso vai ser uma disputa política, na qual a coordenação do Executivo vai tentar direcionar de acordo com suas prioridades.

O Lula está dando um sinal que vai brigar pelo Orçamento. A outra parte, que foi para as emendas individuais, é bastante ruim, porque gera os mesmos efeitos nocivos que as emendas de relator.

Como você enxerga apresentação de uma nova regra de arcabouço fiscal por meio de lei complementar, como ficou decidido?

A PEC diz que o Executivo enviará uma proposta ao Congresso até agosto, mas não diz que ela estará vigente a partir de uma determinada data.

Quando nós fizemos o teto de gastos em 2016, ele foi colocado na Constituição pela experiência com a Lei de Responsabilidade Fiscal, que era uma lei complementar e foi erodida por outras leis complementares.

Acontece que houve uma deterioração na nossa economia política tão grande, que se começou a mudar a Constituição como quem vai à feira comprar meia dúzia de tomates.

Regra fiscal não faz mágica. Quando você tem uma situação política e institucional em direção a aumentar gastos sem limites, não vai ter regra que segure. E o que temos é um Congresso com um perfil pró-gastos e um Poder Executivo que acredita que aumento de gastos resolve todos os problemas do país.

O que uma nova âncora fiscal deve levar em consideração?

Regra fiscal tem que ser com as despesas, que estão sobre controle. É muito atrasado e ineficiente você fazer meta de dívida, que é algo que você não controla. Você pode até usar a dívida como um farol, mas qualquer regra fiscal tem que ser centrada no controle da despesa.

Fonte/Veículo: O Globo

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