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A pauta dos biocombustíveis se tornou ponto de convergência de interesses entre o agronegócio e o governo Lula (PT), protagonistas de uma relação com mais conflitos que momentos amistosos.
O projeto de lei que trata dos combustíveis de base orgânica foi aprovado na Câmara em março, onde recebeu apoio da principal bancada no momento, a ruralista. O texto contou com apoio de 429 deputados, do PT ao PL.
O motivo disso, em grande medida, é o fato de que o agro tem grande interesse na regulamentação do setor, uma vez que os biocombustíveis são feitos a partir de plantações como cana ou soja.
Do lado do governo, o tema, apesar de não ter surgido com esse intuito, foi visto como uma forma de aproximação com um setor com o qual a gestão petista vem sofrendo resistências.
O governo quer, ao mesmo tempo, demonstrar que não atua ideologicamente e agregar valor à matéria-prima ao priorizar esta pauta dentro da agenda de descarbonização.
Alas do agronegócio estão mais ligadas ideologicamente ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e até mesmo fazem oposição à gestão petista em outras frentes no Congresso.
Ainda que seja um gesto relevante para o setor, aliados de Lula acham difícil que integrantes do agronegócio se aliem ou embarquem no governo. A ideia é diminuir resistência.
Outros mais otimistas, por sua vez, dizem que Bolsonaro tinha mais retórica do que propostas para o agronegócio e que, afinal, é um setor pragmático.
Importante mecanismo de combate à crise climática, o projeto dos biocombustíveis tem a característica de, ao mesmo tempo, unir o interesse do Executivo, do agro e do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), um dos principais fiadores da pauta verde no Congresso e ligado à bancada ruralista.
Pessoas envolvidas nos debates em ambos os lados do balcão citam o protagonismo, sobretudo, dos ministérios de Minas e Energia, da Indústria e Comércio e, claro, da Agricultura emdash;o próprio ministro desta última pasta, Carlos Fávaro, era da bancada do agro quando senador.
Dentre os parlamentares, os mais atuantes são Arnaldo Jardim (Cidadania-SP) e Alceu Moreira (MDB-RS), ex-presidente da bancada ruralista e hoje liderando a Frente Parlamentar Mista dos Biocombustíveis.
Na quinta-feira (28), um evento sobre o tema teve na plateia diversos representantes do setor e, no mesmo palco, parlamentares e os ministros Carlos Favaro, Alexandre Silveira (Minas e Energia) e Geraldo Alckmin (Indústria e Comércio, além de vice-presidente).
Durante as falas, diversos acenos e afagos de ambos os lados do balcão. Alceu Moreira, por exemplo, elogiou os membros do governo e encenou um diálogo com supostos críticos.
"As ferramentas de solução para o país são muito mais importantes que as diferenças políticas", afirmou, aplaudido.
Já Fávaro, em sua fala, defendeu a "racionalidade" e disse que os dois grupos podem fazer história juntos, "independente de qualquer bandeira partidária".
"Estar aqui para começar a discutir o futuro com combustível do futuro, com esses parlamentares, com esses empresários, com o governo [...] é a certeza que vale a pena ser resiliente, vale a pena não desistir", afirmou, também sob aplausos.
Integrantes do governo destacam que Alckmin vem sendo um dos principais pontos de diálogo com o setor, uma vez que a pauta dos biocombustíveis é hoje um dos eixos centrais do ministério.
O vice-presidente já foi escalado para ajudar na interlocução com o agro em outras oportunidades, desde a corrida eleitoral de 2022 e também durante a transição de governo.
Nesta quarta (10), durante o Cana Summit, evento promovido pela Orplana (Organização de Associações de Produtores de Cana do Brasil), Alckmin afirmou que "o Brasil vai ser o grande protagonista [dos biocombustíveis], preservando a Amazônia, e quem desmata não é agricultor, é grileiro de terra", afirmou. Seu discurso arrancou aplausos de uma plateia formada por produtores de cana e dirigentes de entidades do setor.
Secretário de Economia Verde, Descarbonização e Bioindústria da pasta chefiada por Alckmin, Rodrigo Rollemberg defende que o setor seja ouvido de forma "pragmática e eficiente".
"É imperativo que o setor produtivo seja ouvido, pois é quem estará na fronteira dos avanços tecnológicos e de descarbonização", disse.
Em outra frente, a pauta também tem ganhado destaque nos ministérios da Fazenda, do Meio Ambiente e no Itamaraty.
Os diplomatas vêm atuando para tentar reduzir a resistência, por exemplo, da Europa aos biocombustíveis. Esta é uma das prioridades do Brasil na sua presidência do G20.
"Os biocombustíveis apresentam oportunidades extraordinárias em termos sociais, econômicos e ambientais, sobretudo em países em desenvolvimento e ainda mais no contexto em que ações urgentes são necessárias para evitar que a temperatura suba acima de 1,5°C", disse à Folha o embaixador André Corrêa do Lago, secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Itamaraty.
O país argumenta, junto a outras nações, que o uso de veículos flex tem contribuído para frota nacional de carros menos poluentes, desde 2003. E que o uso do etanol é um caminho eficaz e já conhecido para a descarbonização do setor de transportes que pode ser utilizado por outros países e no curto prazo.
Na próxima semana, o chanceler Mauro Vieira participa, no Vietnã, de um seminário em parceria com o Arranjo Produtivo Local do Álcool e a União da Indústria da Cana-de-açúcar e Bioenergia, com recursos da Apex (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimento).
Fonte/Veículo: Folha de São Paulo
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