Em que pé está o hub de hidrogênio do Pecém?
Segundo maior porto do Nordeste brasileiro, o Complexo Industrial e Portuário do Pecém (CIPP) se prepara para posicionar o Ceará como um grande player no mercado de hidrogênio verde.
No ano passado, o CIPP anunciou sua ambição de ser um hub do novo energético e, de lá para cá, acumula dois pré-contratos e duas dezenas de memorandos de entendimento com o governo do estado e empresas como AES Brasil, Fortescue Future Industries, Linde, Qair, TransHydrogen Aliance, Eren do Brasil, Casa dos Ventos, Engie, EDP Renováveis e White Martins.
Esses projetos somam 8 GW em capacidade de eletrólise para produzir 1,3 milhão de toneladas de hidrogênio verde por ano.
O segundo pré-contrato inclusive foi assinado hoje (22/9) com a geradora de energia renovável AES Brasil, para iniciar os estudos de viabilidade da produção de até 2 GW de hidrogênio a partir da eletrólise e de até 800 mil toneladas de amônia verde por ano.
Boa parte deve atender uma demanda externa. O cenário de insegurança energética potencializado pela guerra da Rússia está acelerando os planos e subsídios para o hidrogênio de baixo carbono.
Do lado da demanda, a União Europeia colocou como meta alcançar 20 milhões de toneladas de hidrogênio no consumo de energia, no plano REPowerEU. Metade será importada.
Duna Uribe, diretora comercial do CIPP, conta que, para atrair empresas e viabilizar a oferta do produto a um preço competitivo, o porto fornecerá infraestrutura, serviços e condições na Zona de Processamento de Exportação (ZPE).
Os portos industriais são considerados locais estratégicos para hubs de hidrogênio por reunir em um só lugar infraestrutura, potenciais consumidores como indústria e transportes, e saída para outros continentes
Infraestrutura
Em infraestrutura, a administração do complexo do Pecém já indicou uma área de 500 hectares para os projetos, considerando que as empresas interessadas na produção de hidrogênio verde também estão de olho na conversão em amônia emdash; alternativa para exportação e consumo da indústria.
A exportação será pelo Píer 2, que já tem infraestrutura para tráfego de navios e oferece um tanque para armazenamento compartilhado de amônia.
Os serviços incluem uma rede de gás natural conectando o porto à área industrial e soluções compartilhadas de água, como reuso de efluentes e destilação.
eldquo;É importante dizer que nós não estamos olhando apenas para a exportação de uma commodity. Estamos olhando para toda a cadeia de valorerdquo;, disse Uribe durante um evento do Fórum Brasil-Reino Unido nesta quinta.
Essa cadeia começa nos parques de geração solar e eólica onshore e offshore e no tratamento da água usada na eletrólise, passa pela produção de hidrogênio, amônia e combustíveis sintéticos, e pelo armazenamento, distribuição e logística, até chegar no uso final.
Nesta última ponta estão as refinarias, fábricas de fertilizantes, siderúrgicas, termelétricas e transporte, além do mercado internacional.
Competitividade
A competitividade é fundamental. Depende de energia barata, mas também de incentivos.
Segundo Uribe, o Ceará está na fase final de um estudo sobre políticas necessárias para estimular o desenvolvimento desta nova indústria. E cita como exemplo incentivos fiscais para geração de energia dedicada aos projetos de hidrogênio.
Para ser competitivo, o hidrogênio verde precisa custar cerca de US$ 3/kg. Hoje, ele está em média a US$ 6, chegando a quase US$ 9 em algumas regiões do mundo, de acordo com levantamento da PWC.
A Agência Internacional de Energia Renovável (Irena, em inglês) calcula que é possível alcançar essa competitividade até o final da década, especialmente em países com preços de eletricidade de US$ 30/MWh.
Nesse ponto, o Brasil está quase lá, diz Joaquim Rolim, coordenador de Energia da Federação das Indústrias do Ceará (Fiec).
Rolim avalia que os leilões federais de energia já mostram a competitividade da eólica e solar, com os preços próximos a US$ 30/MWh.
Outro ponto é a disponibilidade e complementaridade dessas fontes.
O Ceará tem hoje 5 GW de capacidade instalada, sendo 48% desta energia eólica e 13% solar. Mas o potencial é muito maior.
A Fiec calcula um potencial de 94 GW de geração eólica onshore e 117 GW offshore. Na solar fotovoltaica essa estimativa chega a 643 GW emdash; três vezes a capacidade total instalada no Brasil (185 GW).
Incentivos para o CCS
Outra tecnologia que corre para ganhar um marco legal que dê viabilidade aos projetos é a captura e armazenamento de carbono (CCS, na sigla em inglês).
O CCS é visto como estratégico na produção de hidrogênio de baixo carbono a partir do gás natural, mas também para descarbonizar as operações do OeG e até agregar valor à bioenergia.
Segundo Isabela Morbach, advogada e co-fundadora e diretora da CCS Brasil, o país pode aprender com a experiência internacional e adaptar a regulação à realidade doméstica, especialmente para superar os entraves em torno do armazenamento.